sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Pequeno aviso

Ao contrario do que pensa não tenho nada contra o amor. Adoro amar, tanto faz se é um amor literal, poético ou um amor cotidiano de dormir abraçado e tomar café da manhã juntos. O que eu questiono é a exclusividade, a mania de posse. Você deve estar pensando que isso é o natural, o normal. Confesso-te que tenho verdadeira repulsa ao “ser normal”, lutei durante minha vida toda para fugir desse rótulo. Prefiro ser o excêntrico, o louco, o interessante. No nosso cérebro com o tempo o normal passa despercebido. Quais foram as pessoas que marcaram a sua vida? Aposto que não foram as normais. Então não me peça para ter um relacionamento “normal”, isso não vai fazer que eu esqueça ou deixe de de amar as outras pessoas em minha vida, e falo do amor na sua plenitude: afetivo, carnal, companheiro, intenso, insano...

Eu não necessito da posse e nem a quero. Sou humano e como qualquer um de nós falho. Não posso dar tudo o que esperam de mim e essa certeza faz com que considere a exclusividade injusta e desleal. Quero que usufrua das características que gosta em mim e possa, se desejar, procurar e usufruir as demais características que não apresento em outros.

Estou travando uma luta um tanto solitária contra o mito do amor monogâmico. Não é fácil reverter um processo cultural de muitos anos. Esse amor está impresso no cotidiano, está em todos os lados, ele o é “normal”. Mas aos poucos vejo surgir alguns adeptos, percebo que minhas ideias já não são vistas com tanta reserva. No entanto ainda predomina ao meu redor é uma gama gigantesca de hipócritas, jurando amor e fidelidade e levando uma vida muito mais liberal do que a minha.

Por mais duro que essas palavras possam ser, principalmente para um coração apaixonado e convencional, são mais justas e leais. Eu estou sendo franco desde o principio assumido corajosamente os meus instintos e desejos.

Recomeçar

Minha querida amiga. Recebi a sua carta e li a sua triste história, Ler o que me escreveu fez-me reviver muito do que já passei. Gostaria de poder sinceramente arrancar toda essa dor que tens no peito agora com a mesma destreza que um jardineiro arranca as ervas daninhas dos canteiros floridos. Meu desejo era que jamais tivesse que passar por prova tão terrível, mas não há como voltar atrás e mudar as nossas escolhas. Resta-me tentar te amparar da melhor forma possível.

Pensei em escrever-te para tentar amenizar um pouco do teu penar, vou contar como fiz para me libertar da minha dor e apesar saber que nenhuma história é igual e nem as pessoas reagem da mesma forma aos mesmos estímulos. Acredito que podes encontrar alguns pontos comuns e isso faça você criar as próprias alternativas para recomeçar.

O fim é algo extremamente trágico e muda pouco se foi você ou ela quem decidiu por fim na historia. Acho que quem toma a decisão tem mais facilidade de lidar, pois não é uma mudança repentina, a separação é algo que já vem sendo construída ao longo do tempo e as variáveis e reveses já são pensados e medidos para que a ruptura cause o menor trauma possível. Mas quem recebe a notícia de súbito, por mais que já tenha pensado também no assunto, não teve toda essa preparação e o fel da rejeição nos deixa muito mais amargos. Aceitamos muito bem que tem pessoas que não vão nos amar, mas quando se trata de quem amamos é muito complicado de assimilar.

Quando terminou a minha relação, a primeira reação foi a de ver somente parte do todo, sempre fui muito egoísta. Não tenho muita habilidade para ver além dos meus atos. Depois desse desengano estou tentando entender melhor que não são somente os grandes atos que compõe a cena, há também uma gama gigantesca de pequenos detalhes que por serem pequenos, parecem ser insignificantes. Ledo engano, a cena é composta por milhares desses pequenos detalhes e sem eles não tem espaço para grandes atos ou os mesmos perdem o significado. Em suma, durante todo o meu relacionamento me preocupei muito com os grandes atos e esqueci de dar atenção aos detalhes e assim pouco a pouco fui matando a esperança da minha parceira em construir uma relação sólida e feliz.

Mas vamos ao que interessa. O vaso infelizmente já quebrou, existem tanto as quebras em que ele se parte em vários cacos e são fáceis de perceber, quanto as que fazem apenas pequenas fissuras, essas fissuras nos passam despercebidos, e por isso são tão nocivas. Quando ocorre o clássico acabou por tão pouco, pode ter certeza que lhe faltou habilidade para perceber que ao decorrer do relacionamento você provocou diversas dessas pequenas fissuras e não foi capaz com o seu afeto de repará-las mesmo que sem querer. Por mais hábil que possamos ser em reconstruir nunca mais ele terá a durabilidade de outrora. O vaso colado e reconstruído e mais frágil que sua versão anterior e se por ventura voltar a quebrar e ser reconstruído ficará cada vez mais suscetível a ruir.

Por mais duro que seja aceitar, eventualmente, o para sempre que a gente sonhou não é realmente para sempre. Pode durar uma semana, oito meses, doze anos. Não temos um prazo certo para perceber que quem nos cerca não é exatamente o que esperamos de um companheiro, em alguns casos vamos perceber de imediato, outras vezes vamos ter uma grata surpresa em perceber que de onde menos esperávamos surge o parceiro ideal. Acredito que sempre é valido tentar, é com certeza a maneira mais dolorida de saber se o rumo que se tomou é o correto. Mas também é necessário não ter orgulho em admitir que cometeu um equivoco e voltar atrás.

Com o passar dos anos e depois de alguns amores percebi que não existe como expurgar o amor de uma única vez. Estou falado de amor verdadeiro, intenso, insano, não de pequenas paixões e distrações. Essas paixões levianas, esquecemos como ao guarda chuva em um dia de sol. Para que um amor intenso deixe de nos perturbar leva tempo, não existe um tempo fixo: uns levarão mais outros menos, vai depender também das circunstâncias, do ambiente, da própria vontade de expelir o amor.

Levei aproximadamente um ano para exaurir o amor que carregava pela Annie. Eu não queria, mas sabia que deveria fazê-lo. Pois eventualmente amar também pode ser prejudicial. Iniciei o processo lentamente usando de todas as receitas que já devem ter lhe indicado também. Mas não era um processo fácil, por diversas vezes quando acreditava que estava tendo sucesso um telefonema no meio da noite me fazia esquecer os progressos. Deixava de ser racional e me atirava novamente por inteiro em uma insinuação leve de mudança. Mas tão breve a saudade era saciada voltavam todas as dificuldades de outrora, e ela sutilmente sugeria que eu deviria continuar a batalha para esquecê-la.

Eu a amei tanto que trasbordava amor, e devido a isso o amor ficou espalhado por todo meu ser. Num exercício para tentar entender o porquê nos momentos mais inusitado ainda me pegava amando-a apesar de racionalmente esse amor não ser possível e explicável. Imaginei meu corpo e minha alma como um frasco. Sou cheio de curvas, pequenas rugas e imperfeições e quando estava no auge da paixão, meu coração transbordando de amor ia enviando esse amor para todo o corpo e para a alma. Eu tanto lutei que o transformei em algo muito forte que se enraizou em tudo o que ele tocava. Quando o processo de limpeza começou boa parte se foi, mas sobraram muitas placas desse amor preso dentro de mim. Eventualmente uma delas solta e caprichosamente percorre o meu corpo delgado e sinuoso até chegar ao coração. Não existe como prevê-las. Vem quando acordo, quando me deito, durante o café da manha, no meio da tarde e todas elas contem turbilhão de sensações capazes de me fazer sentir: o perfume dela, o frescor da pele após o banho, e a ver nitidamente as expressões dela ora alegres ora tristes. Percebi também que existem catalisadores e inibidores. Ficar próximo dela, conversar com e sobre ela, assistir filmes românticos, ouvir musicas que falem sobre qualquer forma de amor, ler sobre amor e relacionamentos, vivenciar situações melancólicas estão entre os principais motivos para um fluxo alto de lembranças. Já viagens, amigos fora do circulo de amizades dela, dias de sol, atividades esportivas intensas e grandes doses de adrenalina fazem o transito praticamente cessar.

Quando finalmente decidi trocar aquele amor carnal e totalmente irracional pelo amor fraternal, Utilizei de todos os catalisadores para ver se me livrava de todas as placas de amor que estavam presas em mim. Busquei também criar novas situações e sensações que pudessem sobrepor às antigas. Nessa empreitada acabei por exagerar nas demonstrações de carinho, pois não tinha o amor que demonstrava e acabei frustrando pessoas que me foram preciosas. E por não estar ainda limpo totalmente, e ainda n sei se estou, também não conseguia amar como tinha amado a Annie.

O tempo, não vou ser o primeiro a falar isso, é o melhor remédio para as dores de amor. Somente com o passar dos dias e os eventos que irão ocorrer serão capazes de transformar ou apagar o que sente por alguém. Ter medo do que venha a sentir, ficar inseguro, buscar algo novo e se arrepender, não conseguir se relacionar de imediato, temer ser abandonado novamente, etc. São sintomas comuns que terá de superar. Não precisa ficar desesperada nunca é cedo ou tarde para iniciar um novo amor, o que você tem é que se sentir é apta para iniciar um relacionamento sólido, maduro, afetuoso e se entregar por completo.

Eu hoje me sinto assim, estou calmamente procurado o meu novo amor e tenho certeza que em breve ira cruzar o meu caminho. Assim como o seu, também ira aparecer no momento oportuno.

A vida continua...

Um cigarro aceso, uma taça vazia. Tento inutilmente preencher esse vazio que me assola nesse fim de tarde de mais um domingo. Acordei novamente com alguém ao lado, a noite é lisérgica para mim cria uma sensação de plenitude que me abandona sempre que nasce o sol.

Já foi o tempo em que vivia cheio de sonhos. Eu já quis ser médico, escritor, professor, músico, astronauta, ator. Agora no entanto tento vão preencher meus dias com pouco de alegria e lucidez. Hoje sou apenas o que restou desses sonhos todos que não realizei. Carrego ainda comigo um pouco das mulheres que desejei, das pessoas que passara e de alguma forma deixaram suas marcas no meu cotidiano e dos amores que nunca tive.

Vejo no seu rosto a decepção estampada, sinto por não suprir a sua necessidade. Sei que fiz, mesmo que sem querer, você ressuscitar os teus sonhos de encontrar o teu príncipe encantado. Mas estou longe de ser, e querer ser, um príncipe como o dos contos de fadas. Fiz o que todo homem, ou quase todos, faz: agi docilmente somente para sentir o calor das tuas coxas e deleitar-me com sua volúpia. Após saciado o desejo, volta o vazio e o constrangimento que essas relações casuais sempre produzem em mim.

Deixei o tempo apagar os vestígios de civilidade e generosidade e acabei me transformando no que sou hoje: Alguém que se permite a diversão e o prazer sem medir consequências e os danos que poderei ou irei causar. No entanto por mais calejado que esteja para enfrentar essa situação ela é, ainda, um pouco dolorosa. Não consegui me livrar por completo da culpa por não atender a expectativa, fico sempre com o sentimento de querer fazer mais, que no final acabo sufocando. Não tenho mais vontade e muito menos paciência para viver essas histórias que no início são enebriantes mas no decorrer dos dias tornam-se mornas e tediosas.

Acendo outro cigarro, sirvo mais uma dose de vinho. Vejo ela se levantar, pegar a bolsa e me dirigir aquele olhar suplicante, implorando sem palavras para que eu a impeça de partir. Abro a porta e a deixo sair com os olhos carregados de lágrimas. Fecho a porta e encerro mais um história, igual a muitas outras que essas paredes já presenciaram.

A vida continua...